nekhephthu |cs102

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A nom de musique, I'm guessing, Moimême has at a couple of prepared guitars in what might be called a primitive Rowe-ian fashion in the sense of minimal means and, as he puts it, "the dry output of an old valve amplifier". He works steadily and generally finds things of value, tending toward the dulcet and low-pitched. The shortness of the tracks (11 in 46 minutes) might act against him--I'd like to have heard several pieces developed at greater length--but as is, it's an enjoyable recording. Brian Olewnick (Just Outside)

A guitarra eléctrica é “o” instrumento do rock, o seu máximo ícone. Mas as potencialidades totais da guitarra só começaram a ser verdadeiramente exploradas a partir da década de 1960 pelas músicas de vanguarda, nomeadamente experimentais e particularmente nos contextos de improvisação. Entre o discurso fragmentário de Derek Bailey (agora tornado instituição) e a experimentação preparada de Keith Rowe (desde o início dos lendários AMM), a guitarra passou a ser vista como instrumento aberto, passível de uma completa desconstrução.
Abdul Moimême, pseudónimo artístico de Rui Horta Santos, é um experimentador que além da guitarra eléctrica tem desenvolvido um consistente trabalho de pesquisa com o saxofone tenor e com outros instrumentos menos usuais. Neste disco, editado pela Creative Sources de Ernesto Rodrigues, Moimême concentra-se num minucioso processo de exploração sónica da guitarra eléctrica. Este é um trabalho solitário, onde não há sequer uma procura de linguagem na forma de matéria discursiva, apenas elementos soltos que pairam no ar, construindo espaços abstractos, cinzentos.
Em diversos contextos (ao lado de Manuel Mota ou com a Variable Geometry Orchestra), Moimême tem desenvolvido um interessante trabalho nas margens do jazz e da improvisação, mas este novo disco leva-o mais além, para os campos da experimentação arriscada. Sem obedecer a estruturas normativas pré-estabelecidas, sobra nesta música uma evocação fantasmagórica de paisagens e texturas, ambiências compostas de fragmentos. Na senda da mais aplicada experimentação de Rowe, Moimême vai ao osso, deixa a guitarra nua. Nuno Catarino (Bodyspace)

Ich ächze unter Nekhephthu (cs 102), E-Gitarrengekrabbel des 1959 in Lisboa geborenen ABDUL MOIMÊME, meist präpariert, ansonsten aber pur, intuitives, geradezu andächtiges Fingerspiel als metalloid federndes und schnarrendes Plinkplonking. fArt Brut, wie Spötter sagen würden, aber mir ist nicht nach Spott zumute. Es ist zu schmerzhaft, sich die verbogenen Drahtstücke aus der Schwarte zu ziehen. Rigobert Dittmann (Bad Alchemy)

Interesting to compare these solo guitar recordings with Olaf Rupp’s recent CD (reviewed in The Wire 301). Both musicians use a Stratocaster and a fairly simple amplification set-up, but whereas Rupp creates chunks of music out of strummed chords and clangorous pull-offs, Moimême turns his guitars ( he also uses a homemade solid body instrument) into zithers, gamelans, tam-tams – nothing, in fact, that sounds very much like a conventional electric guitar. It’s eerie, atmospheric and mostly very successful work, though a bit of a stretch at CD length. Brian Morton (The Wire)

The title, says the protagonist, is “probably a word from a long forgotten language”, while the music was made with a valve amplifier and a couple of prepared electric guitars, the whole recorded live sans overdubs or effects. Grimy, darkish textures tending to an oxidized sort of six-stringed malaise, a gritty tranquillity from which sparse noises and even less “musical” elements spring casually. There seems to be no deeper implication in what Moimême does, other than “constructing space in an organic manner” as per his very words. The problem is that, more than “organic”, this stuff sounds at times excessively frugal, lacking a real artistic sense. What in alternative hands might be recognizable as a generator of at least partially intriguing shades, here becomes the tool for a different kind of noise – sporadically pleasing, but in essence just noise. That said, some of the combinations are not so bad when left to resonate around without additional requests. Nevertheless, this is possibly one of the weakest albums of this group. Massimo Ricci (Temporry Fault)

Feito o confronto entre os dois mais recentes discos de Abdul Moimême, Na Floresta da Chuva Eléctrica (sINK wRECORDS, CD-R 2002) e Nekhephtu (Creative Sources Recordings, 2009), é notória a evolução de um tipo de expressão musical estruturada a partir de matrizes como os blues nas suas diversas formas, e ambientes mais expansivos, inspirados no trabalho de outros improvisadores, para uma linguagem mais aberta e experimental. Entre o exploratório e o meditativo, Abdul Moimême tanto procura o inesperado como retoma vias anteriormente abertas, concepção que vai bem com os ambientes nocturnos que a instalação favorece e deles retira motivo e inspiração. Cada tema evidencia um desejo particular de espacialização e a tradução prática de uma ideia de composição instantânea, apoiada em texturas metálicas suspensas e em motivos de efémera construção. É manifesta a opção por um tipo de linguagem que favorece o risco e o desenho abstracto, com défice de dramaturgia e de ornamentação, servida por arranjos simples, nascidos do cruzamento de duas guitarras eléctricas, uma Fender Stratocaster e outra de manufactura própria, e de um amplificador de válvulas vintage. A partir desta preparação, a que não é estranha a utilização de objectos metálicos afins daqueles instrumentos, as sequências de Nekhephtu, escolhidas com critério e balanço harmónico, revelam à transparência os ecos de uma distância exterior à(s) realidade(s) física(s) que lhe servem de ponto de partida, meditações pessoais sobre os cambiantes do fluxo sonoro e as múltiplas formas através das quais se pode representar a organização do espaço. Eduardo Chagas (Jazz e Arredores)

Mais do que uma proposta musical, este trabalho apresenta uma visão pessoal da criação artística. Como Cage, Abdul Moimême reinventa a relação e o modo de utilização das fontes sonoras, recorrendo a instrumentos preparados e tendo subjacente ao carácter gestual e intuitivo da composição um conceito - referindo-se ao seu espaço de criação, Abdul define-o como uma reflexão sobre a intensidade da vivência dos nossos dias. No fundo, traduz a definição de utopia: a necessidade cíclica de distanciamento de uma realidade adversa à liberdade individual da criação.
Procurando subverter o processo criativo, o aqui guitarrista insiste na procura de novas dimensões sónicas e sinestésicas. Através da utilização em simultâneo de duas guitarras preparadas e diversos objectos, manipula a reverberação de modo a produzir sonoridades e profundidades de campo inesperadas, porém subtis. Apesar da aparente simplicidade dos meios e recorrendo a uma gama limitada de baixas frequências, constrói um espaço sonoro dinâmico, atonal e arrítmico, onde decorre um jogo tensional, labiríntico, quase ficcional. Com efeito, cada tema é uma história sem palavras que decorre num espaço sem contornos, onde os sons fluem, em espiral.
Tatet, Nepwawet, Khebkau (títulos de três dos temas) poderiam ser os nomes de algumas das Cidades Invisíveis que Italo Calvino imaginou para os relatos fantásticos de Marco Pólo a Kublai Kan e que, segundo o músico, poderão ser vocábulos de uma antiga linguagem perdida. As texturas orgânicas que ilustram a capa e o CD, aguarelas da autoria de Margarida Reis Silva, traduzem brilhantemente o carácter biónico da sonoridade dos temas.
Enquanto instalação cénica e sonora, “Nekhephthu” justifica que não se fique apenas pelo registo áudio, incapaz de reproduzir a real dimensão do projecto, mas seja apresentado ao vivo, tornando mais eloquente a sua amplitude experimental. Aguardemos os concertos. Paulo Gonçalves (Jazz.pt)


Abdul Moimême, nome artístico de Rui Horta Santos, será porventura mais conhecido pelos textos que escreve enquanto colaborador da jazz.pt e do jornal Público do que propriamente como músico. O certo é que este guitarrista e saxofonista se tem mostrado bastante activo na cena criativa de Lisboa ao longo dos últimos anos, pontificando em vários projectos (tais como a Variable Geometry Orchestra de Ernesto Rodrigues ou o grupo Potlatch de Monsieur Trinité), e podendo orgulhar-se de já ter tocado com luminárias quanto Jon Raskin, Patrick Brennan ou Wade Matthews.
Editado pela Creative Sources no início deste ano, “Nekhephthu” é o segundo registo discográfico de Moimême em guitarra solo. O primeiro aspecto a destacar neste trabalho é a cisão total com o seu anterior disco, “Na Floresta da Chuva Eléctrica”, uma edição de autor datada de 2002. Pois se “Na Floresta...” é evidente uma certa tendência para a figuração e uma forma de tocar “dentro das regras”, o que vem ao de cima em “Nekhephthu” é a postura exploratória adoptada, apostando em técnicas extensivas e na produção de ambiências e texturas, numa tentativa clara (e aliás assumida) de expandir o seu léxico musical. Uma composição como “Wephthu”, por exemplo, é construída a partir dos efeitos provocados pela preparação das cordas da guitarra com objectos vários, ao passo que num tema como “Khesmu” o ouvimos explorar os harmónicos produzidos pelo passar de um fio por entre as cordas do instrumento.
Os resultados obtidos são bastante diversificados: se em “Nepwawet” é a subtileza e o fraseado intrincado que marcam o desenrolar dos acontecimentos, numa composição como “Pakhmet” é o carácter angular e quase melódico que acaba por sobressair.
Este trabalho representa a faceta mais radical da música de Moimême que até ao momento nos foi dada a conhecer. Se é verdade que, por vezes, fica a ideia que poderia levar um pouco mais além as suas pesquisas, não é menos verdade que há uma consistência assinalável nas técnicas a que recorre. Muito boas perspectivas se abrem, assim, para as próximas etapas da sua evolução enquanto músico. João Aleluia (Jazz.pt)